Este ano, os incêndios da Amazônia não foram o único problema ambiental do mundo. Até na gélida Sibéria foram registrados incêndios que atingiram cerca de 10 milhões de hectares. Arderam florestas no Congo, em Zâmbia, Angola, Portugal e Califórnia. Chuvas torrenciais deixaram desabrigados em locais como Espanha, Índia, Nepal e Bangladesh. Apesar de alarmantes, porém, os números não são os piores já registrados. Mas chamam atenção para a necessidade de cuidarmos mais do planeta.
Transporte coletivo e o meio ambiente
Apontado durante muito tempo como um dos principais vilões da poluição nas grandes cidades, o transporte coletivo, ao contrário, ao concentrar um número maior de pessoas num único veículo, diminui de forma significativa as emissões que seriam causadas pelo deslocamento em veículos individuais. Além disso, por ser uma atividade normalmente acompanhada por órgãos normatizadores e fiscalizadores, há uma maior preocupação em evitar emissão de poluentes. A busca por combustíveis mais limpos e motores mais ecológicos está também diretamente ligada à economia.
De acordo com o Balanço Energético Nacional, o transporte, como um todo, responde por 46,3% das emissões de CO2. Mas estudo comparativo do Ipea mostrou que o índice de emissões dos ônibus convencionais é de 4,6 Pax/km (passageiros por quilômetro), enquanto o dos automóveis chega a 36,1 Pax/km – cerca de 8 vezes mais. Isso significa que, em uma via principal como a Linha Amarela, que recebe cerca de 140 mil veículos por dia, se todos os automóveis fossem substituídos por ônibus, mais de 461 toneladas de CO2 deixariam de ser lançadas na atmosfera todos os dias (mais de 143.832 toneladas por ano).
No caso do BRT, a diferença de emissões é ainda maior. Usando-se como referencial os articulados com motor Euro 5, em termos de poluentes locais (monóxido de carbono (CO)), hidrocarbonetos, óxidos de nitrogênio (NOx) e materiais particulados (MP), as emissões do BRT são 47 vezes menores do que as das motocicletas; 25 vezes menores do que as dos automóveis e 32,5% menores do que as dos ônibus convencionais. No caso dos gases de efeito estufa (poluentes globais), emitem 3,7 vezes menos que as motocicletas, 10 vezes menos do que os automóveis e 9% menos dos que os ônibus convencionais.
Empresas de ônibus do Rio: pioneiras na preservação
As empresas de ônibus do estado do Rio de Janeiro dão um bom exemplo. Sua preocupação com o meio ambiente não é de hoje. No princípio da década de 90, várias delas se dispuseram a tomar medidas para a diminuição de emissão de gases poluentes. Desde participação em reuniões periódicas, organizadas pela Fetranspor, com os representantes dos setores de Manutenção, com presença de técnicos e fornecedores, para análise conjunta de alguns fatores mecânicos, até a utilização experimental de GNV (Gás Natural Veicular). Uma dessas iniciativas, em parceria com o Sesi (não existia ainda o Sest Senat) e a Petrobras, consistia na medição da fumaça do escapamento dos ônibus, e de seu acompanhamento, com verificação das causas de uma emissão maior de particulados para a atmosfera e sua correção. Deu tão certo, que acabou sendo o embrião do projeto EconomizAR, criado depois pela Petrobras, em parceria com a Confederação Nacional do Transporte (CNT) e o Ministério das Minas e Energia. Transformado em Programa, ganhou o Brasil todo e durou muitos anos. Foi o responsável por eliminar, da linda paisagem do Rio de Janeiro, a imagem de ônibus soltando fumaça preta. Hoje, esse controle é feito nacionalmente pelo Programa Despoluir, da CNT, com o Sest e o Senat e as empresas de transporte.
A Fetranspor participou, ao longo dos anos, de inúmeros testes com motores e combustíveis alternativos, tendo produzido vários estudos, como “Alternativas tecnológicas para ônibus no Rio de Janeiro”, publicado em 2012, em parceria com a Coppe-UFRJ. A publicação tornou-se uma referência para estudiosos do setor.Várias dessas iniciativas foram possíveis graças a parcerias com empresas de ônibus do Estado, fabricantes, distribuidores de combustíveis e entidades acadêmicas.
O papel do Selo Verde
O Selo Verde, uma parceria da Fetranspor com o governo do Estado, através do Inea (Instituto Estadual do Ambiente), comemora bons resultados e acaba de ser renovado por cinco anos. O convênio assegura a manutenção da frota dentro dos padrões estabelecidos pela legislação ambiental vigente e de acordo com as rigorosas normas do programa Procon Fumaça Preta, do Inea. O controle é feito de forma compartilhada, por meio de medições e análises dos veículos. Unidades móveis visitam as garagens periodicamente e registram o nível de opacidade da fumaça expelida pelos ônibus pelos ônibus, com um instrumento chamado opacímetro. A partir dos resultados dessas medições, são emitidos laudos quadrimestrais e um banco de dados permite acesso ao histórico das medições. Hoje, o índice de aprovação da frota do Estado é de 98,4%, e os ônibus aprovados exibem o selo em seus vidros dianteiros. Os resultados são espantosos e podem ser consultados na página 17, na seção Termômetro.
O CSA e as boas práticas do setor
Em 2009, a Federação criou o Centro de Serviços Ambientais (CSA), que presta consultoria gratuita às empresas afiliadas ao Sistema Fetranspor, abrangendo as várias questões ligadas ao meio ambiente, desde descarte de rejeitos sólidos até a assessoria na obtenção da licença ambiental.
Após tantos anos de incentivo à preservação do meio ambiente, o resultado pode ser constatado em várias empresas, na forma de boas práticas implantadas, como reúso de água, tratamento de efluentes químicos e biológicos, descarte correto de resíduos sólidos e economia de energia elétrica.
A Revista Ônibus elegeu alguns exemplos de sucesso para mostrar aos seus leitores, nesta edição, devendo voltar ao tema na próxima, pela sua importância.
Amparo: Reúso de água há uma década
A Viação Nossa Senhora do Amparo faz o reúso de água em sua garagem há mais de 10 anos. Tudo começou em 2008, numa parceria da empresa com o Inea, o Setrerj (sindicato das empresas de ônibus da região) e a Fetranspor. O processo já gerou uma economia de 65.510 metros cúbicos de água, o equivalente a 65.510.000 litros, e consiste na coleta e tratamento de toda água utilizada para lavagem de carros, ônibus e caminhões da empresa.
Caminho das águas
Primeiro, a água suja chega a uma caixa de sedimentação de areia (CSA), onde são retidas as partículas mais pesadas. Na segunda etapa, o efluente passa por uma caixa, conhecida como sistema separador de água e óleo (SAO), onde a maior parte do óleo ficará retida. Será depois recolhido em um poço de recalque, que vai elevar a massa líquida em uma caixa de água bruta, com capacidade para receber de 70% a 80% do volume d’água captado numa jornada, e onde dar-se-á a equalização. O próximo passo é o Sistema de Tratamento de Água para Reúso (Satra), onde serão usados produtos químicos necessários à limpeza, proporcionalmente ao volume a ser tratado. Duas etapas acontecem, nesse momento: a mistura rápida, para diluição dos reagentes, e a agitação lenta, para formação de flocos.
Depois de tratada, a água passa para uma caixa de sedimentação, onde a sujeira flocalizada irá se depositar no fundo. Esse material será conduzido para um local exposto ao sol, para secagem e posterior descarte em aterro sanitário, como resíduo inerte classe II. A água passa ainda por bateria de filtros pressurizados, com leitos de areia classificada e carvão ativado, saindo limpa para um reservatório, onde receberá dose extra de solução para controle microbiano e de espuma. Após todo esse processo, estará pronta para a reutilização.
A diretora Bárbara Caetano explica que a Amparo tem outras ações voltadas para o meio ambiente, como a implementação da Norma Procon Fumaça Preta, com 100% de aprovação da frota pelo Programa Selo Verde e a coleta de pilhas e baterias: “o reúso de água é uma das ações que demonstram o compromisso da Viação Nossa Senhora do Amparo com o meio ambiente. Hoje, estamos engajados em buscar a certificação na norma ISO 14001, que determina as diretrizes para garantir que a empresa pratique a gestão ambiental com o objetivo de criar estratégias que possibilitem reduzir os impactos causados no meio ambiente”.
Senhor do Bonfim e Turb Petrópolis apostam na energia solar
A Viação Senhor do Bonfim, de Angra dos Reis, no litoral fluminense, inaugurou, em setembro último, sistema com 440 painéis de 335 Wp, (Whats Pico), atingindo a potência total instalada de 147.000 Wp, numa área de 1.000 m2, em sua garagem, cuja área total é de 20.000 m2.
A capacidade de geração mensal é de 15.500 kWh (quilowatt-hora) de energia. “Ou seja: são 186 mil kWh ao ano, o que representa em torno de 65% do nosso consumo de energia aqui na garagem”, explica Max Gollo, diretor presidente da empresa. Ele fala sobre os motivos que levaram a Senhor do Bonfim a aderir à utilização da energia solar: “a responsabilidade com a questão ambiental, evitando a emissão de 9,9 toneladas de CO2 por mês e representando o plantio de 255 árvores; e a economia que pode proporcionar para a empresa”. O sistema adotado utiliza placas Q-Cells, inversores Fronius e teve como responsáveis as empresas B&F Solar, de Rinópolis (SP), e Celb Solar, de Angra dos Reis (RJ). Entre a homologação e o funcionamento, o intervalo foi de 60 dias, e a manutenção é extremamente simples: basta lavar em água corrente. A empresa espera ter o retorno do investimento em três anos. O sócio da Celb Solar, Carlos Erick, explica que, mesmo em períodos com menor exposição solar, os resultados são satisfatórios. No caso da Senhor do Bonfim, por exemplo, diz: “Apesar de outubro ter tido 13 dias chuvosos, atingimos a meta de geração. Nos dias chuvosos, produzimos 200 kW/dia e, nos melhores, 800 kW/dia, o que resultou na média esperada de 500 kW/dia”.
A Senhor do Bonfim também adota outras medidas de preservação ambiental, como a captação de água das chuvas para utilização na lavagem dos veículos, em um reservatório de 60 mil litros. Em julho passado, a empresa renovou, por mais cinco anos, sua Licença de Operação (LO), emitida pelo Inea-RJ.
Já a opção da Turb é decorrente do posicionamento de todo o grupo empresarial ao qual pertence. A empresa também tem outros procedimentos sustentáveis, como a utilização de água de chuva e o descarte correto de sólidos e líquidos e mantém até mesmo uma área de 6 hectares de reflorestamento, como forma de compensar o carbono gerado pelas suas atividades.
Foi iniciativa do grupo a utilização de placas fotovoltaicas nas garagens de diversos pontos do País. No caso da empresa petropolitana, foram instalados 348 módulos de 365 Wp, atingindo a potência total instalada de 127.020 Wp, em área de 800 m2. A Turb tem posição geográfica privilegiada para a captação solar e uma área extensa, o que favoreceu a instalação.
Já em operação, o sistema deve gerar cerca de 36 toneladas de crédito de carbono anualmente, o que equivale ao plantio de 150 árvores e deve proporcionar uma economia média mensal de R$ 12.100,00, chegando a R$ 145.000,00 no período de um ano. A geração de energia anual prevista é de 169.000 kWh. O projeto foi executado pela empresa Sustenta Brasil, sediada em Santos, SP.
Alexandre Simões, diretor executivo da Sustenta Brasil, que tem 10 anos de atuação no mercado, explica que a ideia inicial era compensar a energia consumida pelo VLT de São Paulo, o que geraria uma pequena redução. Após análise aprofundada do assunto, o grupo empresarial acabou fazendo uma concorrência para implantar o sistema de energia fotovoltaica em 11 de suas garagens. Hoje, a Sustenta Brasil tem obras de implantação em 25 garagens, com estudos de análise de viabilidade em mais 35. Simões acredita que a empresa é a que mais tem experiência no setor ônibus, com cerca de 50 endereços em todo o País. “Esse boom é consequência dos altos custos de uma empresa de ônibus com a energia elétrica, graças a atividades como consertos com utilização de solda, lavagens de veículos, vulcanização de pneus e outras”, explica Simões.
Para Jean Moraes, diretor da Turb, o reconhecimento da sociedade foi o maior ganho do projeto. A operadora passou a ser vista de outra maneira na cidade, e acabou por atrair os olhares da mídia. “A posição estratégica da empresa ajudou muito, pois a incidência solar é muito boa, e a visibilidade que as placas têm acabou por chamar a atenção de todos”. Ele se mostra bastante satisfeito com outro efeito da instalação: muitas pessoas e empresas passaram a se interessar pela utilização da energia solar, dirigindo-se constantemente à Turb para obter informações. J ean destaca que o fato de a energia elétrica no Estado ser muito cara faz com que o retorno do investimento seja ainda mais rápido. “Ainda não temos uma conta cheia para saber exatamente quais os ganhos até agora, mas temos certeza de que a economia é muito grande”, afirma.
Os módulos fotovoltaicos têm garantia de performance de 25 anos, sendo que, no primeiro, é de 98% e nos seguintes há uma perda linear, até atingir 25 anos com 86% de geração mínima. O painel continua gerando após os 25 anos de vida útil previstos.
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